domingo, 2 de setembro de 2012

A namorada


Quando eu tinha treze anos, arrumei uma namorada. Paixão ao primeiro sorriso direcionado à minha mirradinha pessoa. E ela também correspondeu ao encanto, ficou deveras enamorada por mim, naqueles dias. Entretanto ela não gostava de namorar comigo. Somente me namorava quando ficávamos a sós, escondidos. Aí sim, aproveitávamos. Eu lhe contava umas historinhas, todas inventadas, evidente, lhe falava dos filmes que passavam na televisão, filmes do impressionante Robocop, do Rambo, Superman, etc, das telenovelas, novela Tieta, Irmãos Coragem, O Outro, e narrava as brincadeiras com os meninos e as meninas da cidade, das nossas artimanhas para ludibriar as mães, como roubávamos ameixa da vizinhança, como era gostoso brincar no parquinho com todas aquelas parafernálias, instrumentos do divertimento, modernas ferramentas para divertir feitas a ferro fundido, lhe contava dos jogos de futebol na quadra coberta, dos tropicões nos paralelepípedos, que, à noite, precisávamos trancar as portas com medo de eventuais assaltos. Ela morava na roça. Lá, não havia televisão, parquinho, quadras cobertas, ruas com calçamento, ladrões... Lá, roubar ameixa não tinha graça, lá, as ameixas apodreciam em todos os pomares. Fartura.  Porém, ela sabia, e eu sabia que ela sabia, que lá em casa também não havia televisão. Ela havia reparado nas minhas calças de brim pra lá de velhas e nos meus chinelos de dedos. Era por causa dos meus chinelos de dedos e das minhas calças de brim puídas que ela somente me namorava às escondidas. Ela contava pras amigas que namorava um garoto da cidade, e, na teoria, garotos de cidade não andavam por aí de chinelos de dedos e calças de brim desgastadas. Certo dia, lhe pedi um beijo. Ela trovejou “só se tu me deres um laka como fazem num comercial da tevê”.  Não foi preciso me dizer que o pai dela comprara uma televisão. Eu deduzi que perdera, além do beijo, a namorada. Culpa da televisão.

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