A demanda terminará em risos e tu te irás absolvido
Horácio
Para Cristiane Maluf,
Prof.ª de direito civil,
deveras.
E na Faculdade de Direito-
FADIR eu com a bolsa cheia de livros de literatura, eu carregando (pelo menos
três cada dia) e lendo Ulisses (James Joyce), Exortação aos crocodilos (António
Lobo Antunes), Todos os fogos o fogo (Julio Cortazar), Da preguiça como método
de trabalho (Mario Quintana) A obscena senhora D. (Hilda Hilst) A idade do
vexame (Cesar Cruz), O buraco na parede (Rubem Fonseca), Dublinesca (Enrique
Vila-Matas) e Os detetives selvagens (Roberto Bolaños), eu que deveria ter
vergonha na cara e parar de enganar meus velhos pais que gastam uma pequena
fortuna com a mensalidade do curso de direito, eu que na verdade deveria ler
livros de Gilmar Mendes (Direito Constitucional) Carlos Roberto Gonçalves
(Direito Civil) Maurício Godinho (Direito do Trabalho) Rogério Greco (Direito
Penal) entre outros, eu na FADIR com a bolsa estufada de livros de literatura e
nenhum de direito, eu que enganava meus pais dizendo a eles que estava me
dedicando no curso de direito, quando na realidade estava interessado mesmo em
literatura, eu que passava o dia inteiro escrevendo pequenas narrativas, contos
e crônicas, e publicando-os num blog na internet, eu que, ao me inscrever no
curso de direito, fazia a vontade dos meus velhos pais, ambos advogados de
renome aqui em Campo Grande, mas que no fundo gostaria de passar a vida não
advogando, mas sim escrevendo livros de literatura, eu que tinha um irmão mais
velho procurador da república e uma irmã mais nova juíza federal, eu, o filho
do meio, uma negação como se referia
à minha pessoa meu irmão, que sempre desejei frequentar uma faculdade de filosofia
e também de letras, mas que na verdade não acabei frequentando nenhuma, eu
sempre atrasado nos estudos, um nefelibata
retardado como dizia minha irmã, eu que na aula de direito civil, me
sentindo um peixe fora d’água, à questão peremptória da professora Cristiane: - Ricardo, defina contrato com pessoa a
declarar e dê um exemplo, eu distraído e a questão inexorável: - Ricardo, fale um pouco sobre os requisitos
da evicção, e eu já evicto e mais
uma pergunta – Ricardo, cite as ações
cabíveis no caso de ocorrer vício redibitório, eu, humilhado, tendo de
apelar, com a voz empolada: - Professora
Cristiane, responderei da mesma forma que Santo Agostinho quando lhe
perguntaram o que era o tempo: “se não me perguntam, eu sei; todavia se me
perguntam, não sei explicar”, então peço licença e saio às pressas da sala
de aula, eu, correndo, saio da FADIR, eu
e minha bolsa abarrotada de livros de literatura não combinamos com a FADIR, eu
o nefelibata retardado atrasando os
colegas pragmáticos que em uníssono saberiam responder todas as questões
propostas, então eu peço licença e me retiro da aula de direito civil da
professora Cristiane, preciso concluir a leitura do bom e sábio Mario Quintana:
Da preguiça como método de trabalho.
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