sábado, 8 de setembro de 2012

Fumos boni civis


Emocionamo-nos com as ficções; mas somos indiferentes à dura realidade.    Confundimos as ficções da realidade com a realidade das ficções. Choramos nos filmes e maltratamos o primeiro mendigo que encontramos.

Lenio Luiz Streck.


Um pobre cão abandonado. Um dócil vira-lata mirradinho, dormindo, encolhido num canto, sob o mais duro concreto. Enquanto Cristiano, munido de seu espírito altruísta calibre 45, se aproximava, visualizou: era um filhote, judiado pela noite que se derramava em orvalho. Orvalho que em breve, por causa do clima gélido que pairava, naquele mês de julho de 2012, sobre Campo Grande, se transformaria, inexoravelmente, em geada. Salvar o combalido cachorrinho deu trabalho (mas nada que arrefecesse seu ânimo de caridade): precisou repelir, com certa força, um trôpego mendigo bêbado que dividia, com o miúdo canino, o canto escuro de um prédio abandonado na Avenida Afonso Pena. - Ô raça humana! Não demorou muito (ele morava ali perto numa aconchegante mansarda) e o agraciado cãozinho dormia, agora bem alimentado, num felpudo tapete. Deu-lhe o nome de Fumaça, por causa da névoa dessa noite, que dificultou, mas não o impediu de realizar um ato de amor à vida.


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