Emocionamo-nos com as ficções; mas somos indiferentes à dura
realidade. Confundimos as ficções da
realidade com a realidade das ficções. Choramos nos filmes e maltratamos o
primeiro mendigo que encontramos.
Lenio Luiz Streck.
Um pobre
cão abandonado. Um dócil vira-lata mirradinho, dormindo, encolhido num canto,
sob o mais duro concreto. Enquanto Cristiano, munido de seu espírito altruísta
calibre 45, se aproximava, visualizou: era um filhote, judiado pela noite que
se derramava em orvalho. Orvalho que em breve, por causa do clima gélido que
pairava, naquele mês de julho de 2012, sobre Campo Grande, se transformaria,
inexoravelmente, em geada. Salvar o combalido
cachorrinho deu trabalho (mas nada que arrefecesse seu ânimo de caridade): precisou
repelir, com certa força, um trôpego mendigo bêbado que dividia, com o miúdo
canino, o canto escuro de um prédio abandonado na Avenida Afonso Pena. - Ô raça
humana! Não demorou muito (ele morava ali perto numa aconchegante mansarda) e o
agraciado cãozinho dormia, agora bem alimentado, num felpudo tapete. Deu-lhe o
nome de Fumaça, por causa da névoa dessa noite, que dificultou, mas não o impediu
de realizar um ato de amor à vida.
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